•.¸¸.ஐ Luz que clareia meus escuros ஐ Capítulo 1

"Faltas

Os relâmpagos cortavam o céu
Os trovões faziam tudo tremer
As gotas de chuva caíam
O vento uivava
E as árvores pareciam tocar seus galhos ao chão
De repente, tudo ficou calmo
Já era noite e o céu estrelado
Saudava a lua maravilhosamente cheia
Despontando detrás das montanhas azuis...
Era para ser perfeitos,
Mas faltava você.

O mar em rebentação rebelava-se nas pedras
Cavava buracos na areia
Cuspia algas, conchas, lixo e náufragos
Pedaços de embarcações e redes de pesca
Da praia podia-se observas as ardentias.
De repente, tudo ficou calmo
O sol desabrochava num céu anil
Acompanhando os pássaros em revoada...
Era para ser maravilhoso,
Mas faltava você.

O vento transparente cortava as campinas
A verde relva estava colorida
Por flores de todo tipo
Atraindo borboletas multicoloridas,
E pássaros de plumas esvoaçantes
De repente, tudo ficou quieto
O céu escureceu, o mar se rebelou
E até mesmo o tempo, implacável, parou...
Era para ser eterno,
Mas faltava você!”



Depois de uma noite de sonhos agitados, o corpo parece ainda mais cansado que quando deitou. Abri os olhos com preguiça e achando um crime aquela escuridão confortadora da noite ter de ir embora. Definitivamente, o dia sufoca as paredes da inconsciência. Sinto esse sufoco a cada sol que nasce. Esperar pela manhã deixou, há muito, de fazer sentido. Só quero a noite em meu colo como uma gata que esconde duas luas de insônia com o fechar dos olhos cansados.

Parabenizei-me por conseguir pensar isso tudo logo após abrir os olhos. Geralmente, demoro um pouco mais para acordar. Mais precisamente, o tempo que fico embaixo do chuveiro frio.

Parei em minha escrivaninha, na seção de CDs e escolhi um para levar ao banheiro. Nele se lia seleção, saiu da capa e foi direto tocar no som. Fiquei feliz em escutar a voz de Notis Sfakianakis ecoando em meu banheiro. Não poderia começar melhor o dia!

Entrei debaixo do chuveiro e fiquei ali tentando adivinhar qual seria a próxima música. Enquanto as faixas tocavam, eu tinha a certeza de que era o CD perfeito para se dar de presente ao grande amor da sua vida.

Parei. Que história é essa de grande amor da sua vida? Fechei o chuveiro, meio assustada.

Nunca havia pensado nisso antes... Na verdade, nunca havia acreditado. Tive muitos relacionamentos, alguns muito bons. Mas amar... Não. E isso não me incomodava. Pelo menos não até esse momento.

Saí do box, desliguei o som e voltei para minha cama ainda desfeita. Fiquei intrigada com aquele meu pensamento tão surreal a mim. O que estava acontecendo?

Não que não fosse bom, mas a ideia de querer alguém dentro de minha casa 24 horas, todos os dias da semana, todos os meses do ano, assustava-me. O conforto de morar sozinha por escolha própria era um refúgio difícil de querer abrir mão.

Eu havia deixado o conforto da casa de minha mãe num bairro residencial de Amphipolis, uma das mais belas e grandes cidades gregas da atualidade e onde nasci, assim que me formei na Academia. Desde que passava os fins de semana em Porto de Elara quando criança e adolescente, sonhava em ter uma casa por lá.

Quando me formei em Letras na Academia Ateniense, minha mãe me entregou as chaves de minha casa e o cartão de uma conta bancária. Presente de meu pai, falecido desde que eu tinha dez anos, que ela fez questão de honrar e nunca revelar nada sobre. Mas, ultimamente, estava sentindo aquela casa, a minha casa, vazia.

Olhei para o teto e as estrelas que havia pintado lá. Duas gotas teimosas lacrimejaram pelo meu rosto. Antes que pudesse começar outro pensamento, meu telefone tocou. Era da editora onde trabalhava.

— Alô?

— Bom dia. A senhorita Shayiera Halliwell, por favor.

— É ela. O que foi?

— O senhor Edgar pediu para ligar e avisar que marcou uma reunião extraordinária hoje, às 11 horas, no escritório dele.

— O quê? Ele enlouqueceu? — alterei o tom.

— Desculpe, eu só estou dando o recado — disse uma voz apaziguadora e um pouco assustada.

— Não... Eu quem peço desculpas... Você é nova aí? — aquela voz não me era familiar, mas aprovei.

— Ah, sim. Estou cobrindo as férias da outra secretária. Meu nome é Fernanda.

— Ok. Diga ao nosso chefinho que eu estarei aí.

Arrumei o quarto de qualquer jeito e abri meu closet. Não queria pensar em roupa. Peguei minha calça jeans mais confortável e combinei com minha camiseta branca preferida. Óculos de sol, chave do carro, chaves da casa, bolsa completa, sem maquiagem — não suporto!

Desci as escadas e fui para a cozinha. Comi um pouco da salada de frutas que tinha na geladeira. Combinou com o calor da estação. Saí com pressa.

Um engarrafamento depois e cheguei à sede da editora. Estavam me esperando para começar a reunião. Olhei apenas de relance para a sala da secretária nova, mas o suficiente para admirar a beleza que tinha. Sorri e não me censurei por isso.

— Bom dia! — cumprimentei a todos não muito simpática.

— Muito bom dia, Shay — disse Edgar, o presidente da editora, ao me ver. Ele ainda não perdera as esperanças comigo.

— Onde é o incêndio? Temos um candidato ao Nobel de Literatura para convocar essa reunião em pleno sábado de manhã? — disse enquanto me sentava.

Todos na sala riram. Além de Edgar e eu, estavam presentes Roberta, a chefe de edição, e Carlos, o vice-presidente da empresa. A tal Fernanda, nova secretária, chegou uns instantes depois, para o meu divertimento.

— Espero dar o candidato ao Nobel da próxima vez, senhorita diretora executiva e de criação. Por enquanto, terá que se contentar com uma nova poetisa — respondeu Carlos.

Todos perceberam a minha reação de surpresa.

— Você está brincando? — perguntei sem querer acreditar.

— Não, Shay. O Carlos está falando sério — disse a Beta.

— Eu espero que exista um motivo bastante bom para eu ter sido tirada de casa em pleno sábado de manhã por causa de uma nova poetisa! — respondi exaltada e me recostei na cadeira.

— Mas é justamente por isso que chamamos você aqui, Shay! Pensamos que essa nova poetisa é um excelente motivo para fazer você sair de casa em pleno sábado. Queremos fazer um grande lançamento da obra dela. Mas a sua opinião será decisiva. Se você me disser que sim, eu mando o pessoal começar a trabalhar no projeto do livro dela amanhã, mas se disser que não, aí publicaremos, mas de forma mais discreta — falou Beta, fazendo-me ficar interessada no assunto.

— Hum... Deixem-me ver então o que essa nova poetisa tem que deixou a minha equipe de chefia tão encantada logo com o primeiro trabalho — e estendi as mãos para Beta já sorridente.

Ela me deu uma pasta preta um tanto pesada e disse que eu poderia levar para ler em casa, mas que me dedicasse mais que nunca.

— Sim, minha chefinha de edição, tudo o que a senhora mandar! — falei em tom de brincadeira, fazendo todos rirem novamente.

— Ah! Além de escrever, ela desenha também. Acho que você vai se surpreender! — tentou me empolgar o Carlos.

— Mas quanta propaganda! Tudo bem, seja feita a vontade de vocês! Estou indo para minha casa neste exato momento, vou me trancar no meu quarto e só saio de lá quando terminar de ler o material. Está bem assim?

— Esse livro não poderia estar em melhores mãos que nas suas, Shay. Confio totalmente em você para esse trabalho — sorriu a Beta pra mim.

— Uau! Isso é que é rasgar elogios! — riu Edgar.

— Gente, calma, eu sei que eu sou linda, gostosa e competente! E eu dou conta de vocês dois, então, não se afobem! — dei uma piscadinha para cada um, fazendo a Beta chorar de rir e o Edgar ficar com uma expressão de quem está imaginando coisas.

A tal nova secretária não tirava os olhos de mim. Ela pensava que eu não havia notado, mas... Sim, eu notei! Gostei mais ainda do interesse que vi nos olhos dela. Como diria a minha irmã mais nova, Natasha, “ela é da causa”. Segurei o riso ao me lembrar de Tasha.

Guardei a pasta em minha bolsa e me levantei da mesa.

— Estou liberada?

— Só se aceitar almoçar conosco! — respondeu Edgar.

— Vai depender do cardápio, mon cher...

— Peixe. Algo bem leve para suportar esse calor. O que me diz? — quis saber ele todo cheio de esperanças.

Mas peixe era algo que eu jamais recusaria.

— Por mim está ótimo! Vamos ao almoço então.

Esperei que Edgar, Beta e Carlos saíssem da sala só para brincar um pouquinho com o desejo da secretária. Uma coisa que eu adorava fazer.

— Fernanda...

Ela me olhou quase assustada ao ouvir seu nome.

— Quero pedir desculpas mais uma vez por hoje de manhã, ao telefone. Você não me conhece ainda. Não acordo com o melhor do meu humor — sorri simpática e interessada no devido tom.

Ela pareceu ter ficado sem voz, apenas me olhando. Eu já havia passado por essa situação inúmeras vezes. E a Tashinha sempre me dizia que a culpa era minha. “Quem mandou nascer essa mulher deslumbrante? É de tirar qualquer um do sério!”, dizia ela enquanto pulava em cima de mim e me enchia de beijos ao narrar minha altura privilegiada, cabelos pretos e olhos azuis. As visitas dela sempre terminavam em festival de pipoca, sorvete e guerra de travesseiros!

— Ah, imagina, senhorita Shayiera, não precisa pedir desculpas — foi tudo que Fernanda conseguiu dizer.

Não sei bem o motivo, mas gostei dela, talvez fossem as pernas.

— Pode me chamar de Shay, como meus amigos, mas agora vamos almoçar. Meu café da manhã foi uma salada de frutas basiquinha e eu estou com fome! — disse estendendo o braço.

Ela acompanhou cada movimento meu com os olhos e sorriu. Apenas fez que sim com a cabeça e saiu comigo da sala de reuniões.

O almoço transcorreu muito bem. Divertido na medida certa e muito saboroso. Mas decidi não esticar com eles para a cervejinha — que, aliás, eu não suporto. Fui para casa decidida a saber o porquê daquele sucesso todo da tal poetisa com a minha equipe de trabalho.

2 comentários:



luis lourenço disse...

Olá Brunella!
Saúdo o seu regresso...Seus textos são profundos para além de serem encantadores...Me dá sempre muita alegria a sua presença no meu site.

beijinho pra vc.

Véu de Maya

Fil. disse...

quando sai o próximo post? *--*