•.¸¸.ஐ Canção você

O seu corpo é o violão perfeito
Que eu sonho dedilhar
Compor estrofes em seu beijo
Descobrir a música que a faz gozar

Nas notas que seu corpo toca
Quero ouvir meu nome
Quero sentir em minha boca
O prazer de sua mel-odia

Reverberam em meus sentidos os seus sons
Sua partitura de mulher aguça meu querer
Deliro na harmonia de seus meios-tons
E entoo em minha voz a canção você!


•.¸¸.ஐ De mim para Ana Carolina, porque ela me provoca, me atiça e eu amo!

•.¸¸.ஐPétalas incandescentes

Fecundo cada palavra no desejo de encontrar teu olhar
A tua pele é a musica onde quero mergulhar os meus dedos
O teu rosto, as palavras que escreves
O teu corpo, amo em cada verso em silêncio
Composto na minha alma despida, entregue a ti

Eclode a centelha no sublimar profundo
De um murmúrio sensual…
Verto incandescentes pétalas
Inflamando sonhos de nós
Queimando a distância que nos separa

•.¸¸.ஐ Amor em versos

Os mais belos versos que farei de amor
não foram escritos,
mas serão desenhados,
aquarela febril na sublime entrega.
Mulher.
Minha.

O arrepio transpassa a vértebra
no transpirar da abundante volúpia
a umidade no espaço do puro desejo
olhos fechados por prazer
na ponta da língua

Os beijos comporão imperativos versos
possuir-me-á na totalidade do uno
devorar-me-á na impaciente luxúria
até o último vocábulo

Na extensão da epopéia, o êxtase
cósmica explosão, etéreo cintilar de corpos
efervescendo o magma da eterna fusão
escrevendo amor em versos

•.¸¸.ஐReceita de Páscoa

Não há – ou não parece haver – muito mistério em se preparar uma canjica, iguaria bastante tradicional nas sextas-feiras santas. Milho branco, leite que não pode ser o de caixinha, amendoim, coco, cravo e canela – tudo nas devidas proporções, claro. Há ainda as variações com paçoca e leite condensado, mas isso não vem ao caso neste texto.

O que deve ser considerado aqui é uma canjica em especial. A Canjica da vó Maria. Com c maiúsculo mesmo. Vocês devem me perguntar o que há de tão especial assim nessa Canjica. Pois bem, eu também não sei, apesar de desconfiar de algumas coisas...

Desde que passei a acompanhar o processo de fabricação da Canjica da vó Maria – isso deve ser desde os meus quatro anos, então são dezoito de lá para cá – o recipiente usado para o preparo é o mesmo: um caldeirão. Isso se explica pelo fato de a família ser grande. Vó Maria tem muitos filhos, muuitos netos e alguns bisnetos também. E como quase todo mundo adora canjica, a panela tinha que ser grande.

O que reparei também foi que, apesar de tantos palpites de filhos e netos, a vó nunca mudou a receita da Canjica, sempre fez do jeitinho dela, sempre ouviu a todos, mas nunca se deu a novas experiências. Não com a Canjica.

Tá, mas até aqui não temos nenhum ingrediente especial, nada demais, nenhuma marca de qualquer ingrediente que seja sempre usada, o que me leva a novas especulações. Com a Canjica deste ano, vieram 92 anos de experiência de vida, um gosto pelas coisas simples e um amor límpido que transparece nos olhos azuis que ela tem.

Aqueles ingredientes citados logo no primeiro parágrafo foram mexidos por mãos já cansadas, calejadas de trabalho, de lutas e tristezas também. Nunca perderam, porém, a ternura, a esperança. Dentro do caldeirão, foi posta a alegria pela chegada dos netos, dos filhos que vêm para comer a Canjica.

E, mais uma vez, a gente nem esperou a tampa do caldeirão baixar e já fazia fila com as canecas fartas em volta. Todo mundo rindo, temperando ainda mais a Canjica da vó Maria.

•.¸¸.ஐMenina perdida

Eram duas horas da madrugada quando ela fechou a porta a suas costas. Aquelas seriam as últimas lágrimas derramadas em seu quarto. Aquela seria a última briga em casa. “Aquela garotinha de cabelos cacheados e riso fácil morreu e foi você quem a matou”, ela gritou por desespero e por desabafo a uma mãe alterada, incapaz de vê-la adulta, dona do próprio destino, dos próprios sonhos e desejos.

Quando trancou o portão e jogou as chaves fora, uma dor lancinante, aguda e fria transpassou-lhe o peito. Os joelhos dobraram, mas ela se recusou a cair. Sabia que toda separação doía. Mas sabia que a dor não durava para sempre. Ou até durava, mas depois perdia a intensidade, virava melancolia até ir doer na memória apenas. Nada que boas doses de vodka não pudessem curar.

Mas aquele era o momento de doer e sentir a dor. Era o momento de ver aquele flashback de momentos felizes, de cachos ao vento, de ovos de páscoa, de dias das crianças com muitas caixas coloridas, de noites de Santa Luzia com expectativa de surpresa, de natais com o Papai Noel.

Ela se lembrou de todos os prêmios que ganhou na escola, de todas as vezes que só tirou 10 nas provas, de como se esforçou para ser a garota perfeita. Até que se perdeu de si e não sabia mais quem era. E o caminho de volta para si mesma doeu.

Quantas noites chorou sozinha, baixinho, com medo de acordar alguém? Quantas vezes quis fazer uma pergunta e não tinha ninguém para ouvir? Quantas vezes o medo em seus olhos foi visto como petulância? Quantas vezes ouviu sua mãe dizer que sabia exatamente o que ela estava pensando, quando tudo que ela emitia era um pedido de socorro?

Doeu. Ainda dói. Mas ela cresceu. Sozinha, fechada em si. Viveu todos os dilemas sem contar com ninguém para ajudá-la, para orientá-la. E não foi por falta de tentar. Mas chegou um ponto em que ela desistiu. Abandonou uma relação que se perdeu em alguma esquina do passado. Ela cresceu e não se parecia em quase nada com sua mãe. A não ser pela teimosia. Ela amadureceu.

Não foi fácil se olhar no espelho. Não foi fácil ver quem ela era, tão diferente da garota perfeita, tão cheia de falhas, tão distante da filha querida. Mas ela decidiu viver conforme sua essência, mesmo que tivesse um preço a pagar por isso. Só não sabia que era tão alto.

Muitos sorrisos que conhecia se apagaram. O que antes era tolerância, virou revolta, incompreensão explícita, verbal, mordaz. E ela ouviu calada. Até ontem à noite. Ela sofreu calada. Até ontem à noite. Ela viveu calada. Até ontem à noite.

- Eu não sei, minha filha, quando foi que você se perdeu. A sua convivência com essas pessoas que não vão à igreja levou você para esse caminho. Eu não entendo, filha...
- Chega! – olhar duro, voz ferida – Eu não vou ouvir mais nada. Agora sou eu quem vai falar.

A mãe se assustou. Não estava acostumada a escutar a menina, sempre em silêncio, enquanto destilava sua ladainha de motivos, tergiversando sobre o comportamento dela, o jeito dela, as escolhas dela.

- Você me julga sem me conhecer, sem nunca ter me perguntado nada a meu respeito. Você não sabe o que eu sinto.
- Eu te conheço mais do que você pensa, menina.
- Ah é? Então me diz qual é o maior sonho da minha vida.

Silêncio.

- Qual a minha cor preferida?

Silêncio.

- Qual é o livro que mais me marcou?

Silêncio.

- O que eu mais amo fazer?

Silêncio.

- Você não conhece a minha essência. E desde que eu nasci, tentou me fazer uma cópia de você. Quis que eu fosse alguém que você sonhou em ser. Mas eu tenho os meus próprios sonhos. Eu tenho as minhas verdades. Nós não acreditamos nas mesmas coisas. Você não sabe o quanto doeu me descobrir perdida e eu não tinha ninguém para conversar. Você não sabe o quanto doeu me saber diferente e eu não tinha um colo para aonde correr. Mas eu cresci, sem você. E eu me encontrei.

Incrédula, a mãe olhava a jovem. Segura como nunca a vira antes, dona de si. Algumas lágrimas lhe escorriam na face. De repente, ela se deu conta de que não conhecia a garota a sua frente.

- Me chame do que você quiser. Eu sou mesmo uma menina perdida. Mas eu me encontrei, plenamente, nos braços de uma outra menina perdida, como eu. E você goste ou não, aprove ou não, eu vou viver isso até o fim. E se não for com ela que passarei o resto da vida, eu vou continuar procurando alguém. Mas não espere um genro de mim, o máximo que eu posso te dar é uma nora. E eu não preciso que você me ame. Eu quis isso, eu quis muito isso, mas se eu tiver que deixar de ser eu pra ser amada por você, muito obrigada, mas pode ficar com seu amor. Eu nunca serei a garota perfeita.
- Você mudou tanto... Eu tenho tanta saudade da minha menina de cabelos cacheados e riso tão doce...
- Aquela garotinha de cabelos cacheados e riso fácil morreu e foi você quem a matou! – gritou, silenciando a mãe, a casa, a relação.

Uma dor muda em ambos os olhos, um choro sem lágrimas em ambas as faces. Um tapa ecoou em todos os cômodos da casa e rompeu o tênue laço que ainda as unia. De olhos fechados, a garota pôde ouvir o vidro se estilhaçando dentro de si. Estava acabado. Dali em diante, seguiria como sempre, sozinha.

Entrou para o quarto e logo juntou suas coisas. Couberam numa grande mala vermelha. Além das roupas, sapatos e livros, carregava também seus sonhos, os antigos e os novos. Todos. E ali deixava todas as suas lágrimas, as lembranças de suas noites mais frias e de tantas preces não ouvidas.

A garota saiu no portão e jogou a chave fora. Uma chuva fina e constante começou a cair. A menina abriu os braços para os pingos e eles a abraçaram. E ela seguiu, sem olhar para trás. Mais uma vez, ela cresceu.



•.¸¸.ஐ"Each time I make my mother cry, an angel cry and falls from heaven" - Marylin Manson.

"As meninas perdidas, por algum motivo, perdem suas mães muito cedo, às vezes porque não se sentem compreendidas, às vezes porque seguem a trilha de outra menina perdida que as leva para longe de casa e outras vezes porque é inevitável e escolhem partir antes que suas mães derramem lágrimas, para que anjo nenhum morra ou caia do céu" - Vange Leonel; Balada para as meninas perdidas.

•.¸¸.ஐFleur d'automne

Amanheci outono...
Um ar gélido toca minha face efêmera
e colhe, cálido, meu amor eterno...
Sou a magia imperfeita
da libertação dos silêncios da alma

Entrego meu ser às estrelas
e corro livre junto ao vento
perseguindo as vozes da lembrança
para resgatar minha história perdida no tempo

Busco versos encantados e atemporais
querendo saciar meu desejo surreal
de fazer encontrar Sol e Lua

Envolta nos mistérios cavalgo pelos sonhos,
velejo nos mares de tua saudade
e passeio leve pelo teu pensamento

Sendo filha da vaga imaginação,
danço em tua alegria, sou parte de tua emoção
e caminho serena na palma de tuas mãos

Brincando de ser poetisa,
escrevo meu nome em tua vida
instalo-me no aconchego de teu coração
como brisa encantante viajando pelos perfumes do ar

Calo meu olhar e guardo a noite...
Sou inteira flor das suas fantasias
meus lábios pétalas desabrocham beijos
na imagem querente de tua boca terna...